Os ucranianos utilizaram os Sistemas de Mísseis Táticos do Exército, conhecidos como ATACMS, para atacar um depósito de munições na região de Bryansk, no sudoeste da Rússia. Segundo o Ministério da Defesa russo, Kiev disparou seis mísseis balísticos. O ataque ocorreu três dias após o presidente dos EUA, Joe Biden, dar sua aprovação para o uso deles, um pedido da Ucrânia.
Ontem, Putin assinou uma revisão da doutrina nuclear russa, que amplia as circunstâncias nas quais Moscou pode lançar um ataque atômico contra a Ucrânia e países da Otan. Ele declarou que um ataque com armas convencionais à Rússia por qualquer nação que seja apoiada por uma potência nuclear, como os EUA apoiam a Ucrânia, será considerado um ataque conjunto ao seu país.
Ao ser questionado se a doutrina atualizada foi deliberadamente publicada após o aval de Biden aos ucranianos, o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, disse que Putin instruiu o governo a atualizá-lo no início deste ano para que estivesse "de acordo com a situação atual".
Segundo a doutrina, a Rússia pode usar armas nucleares em resposta a um ataque nuclear ou convencional que represente uma "ameaça crítica à soberania e à integridade territorial" da Rússia e de sua aliada Belarus, uma formulação vaga que deixa amplo espaço para interpretação.
Mil dias
A elevação das tensões ontem marcou o milésimo dia da guerra, iniciada após Putin invadir a Ucrânia, em 24 de fevereiro de 2022. No Rio representando a Rússia na cúpula do G-20, o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Serguei Lavrov, defendeu os novos critérios para acionamento do arsenal nuclear e disse que eles não se diferem dos adotados pelos EUA.
O Kremlin usou durante toda a guerra a ameaça de implantar seu arsenal nuclear para tentar dissuadir o Ocidente de fornecer suporte militar mais robusto à Ucrânia. "Isso (disparo contra a Rússia) é um sinal de que eles (ucranianos) querem escalar o conflito", disse Lavrov. O ataque, segundo ele, marca uma nova fase na guerra.
Em Washington, porém, a Casa Branca considerou a revisão como mais um blefe. "Isso é mais do mesmo discurso irresponsável da Rússia, que temos visto pelos últimos dois anos", disse uma porta-voz do Conselho de Segurança Nacional.
Força
O uso dos mísseis americanos contra a Rússia também representou uma demonstração de força da Ucrânia, que tenta provar aos aliados ocidentais que fornecer armas mais poderosas e sofisticadas valerá a pena - degradando as capacidades de combate da Rússia e aliviando a pressão sobre as forças sobrecarregadas de Kiev.
Moscou disse ter abatido cinco dos mísseis táticos e danificado mais um. Os fragmentos caíram em um instalação militar não especificada e provocaram um incêndio, sem causar vítimas ou danos, segundo o governo russo.
Autoridades ucranianas e analistas militares, que há muito alertam que nenhuma arma mudará o curso da guerra, observaram que o impacto da mudança na política da Casa Branca dependerá da quantidade de mísseis fornecidos.
O governo Biden finalmente aceitou ceder aos pedidos dos ucranianos, em parte, após a mobilização de até 10 mil soldados norte-coreanos ao esforço de guerra de Moscou. A autorização veio apenas dois meses antes do retorno ao cargo do presidente eleito, Donald Trump, que disse que buscará um fim rápido para a guerra na Ucrânia.
Sua eleição gerou incerteza sobre se os EUA manterão o forte apoio militar que deram à Ucrânia sob o governo de Biden ou se adotarão uma abordagem diferente. Seja como for, a decisão dos EUA coloca Putin em uma posição difícil: decidir se responde aos ataques sabendo que em poucas semanas terá de lidar com um governo americano diferente.
Arsenais
Na frente de batalha, a Rússia está ampliando seu poder aéreo, de artilharia e de pessoal nas linhas defensivas no sudeste da Ucrânia. Ao mirar em centros de logística como em Bryansk, a Ucrânia espera tornar mais difícil o suprimento de forças russas.
A Rússia tem sistemas de defesa aérea robustos, incluindo baterias S-400 projetadas para combater mísseis balísticos como os ATACMS. O S-400 e o mais novo S-500 são semelhantes aos sistemas Patriot de fabricação ocidental usados para proteger os céus ucranianos.
Restrições
Desde que os primeiros ATACMS chegaram à Ucrânia, em abril, Kiev tem usado seus suprimentos limitados para atingir os sistemas de defesa aérea russos em áreas ocupadas da Ucrânia - particularmente na Crimeia - com algum sucesso, de acordo com imagens de satélite, analistas militares e autoridades ucranianas e ocidentais.
Mas durante a guerra, no momento em que um lado introduz uma nova capacidade, o outro lado trabalha para se adaptar. "A eficácia russa contra mísseis ATACMS, provavelmente, aumentará, mesmo que lentamente, ao longo do conflito, à medida que a Rússia treina equipes de defesa para lidar com a ameaça", escreveu Jake Mezey, especialista em segurança, em relatório para o centro de estudos The Atlantic Council.
Os EUA forneceram ATACMs à Ucrânia pela primeira vez em outubro de 2023, mas os mísseis foram projetados para atingir alvos a apenas 160 km de distância. O governo Biden enviou apenas um pequeno número - menos de duas dúzias nas primeiras remessas - e a mudança ocorreu somente depois que a contraofensiva ucraniana do ano passado já havia falhado.
Em abril, os EUA concordaram em fornecer secretamente ATACMS com um alcance de 305 km para a Ucrânia. No entanto, Washington restringiu seu uso para atingir forças russas localizadas em território ocupado pela Ucrânia, incluindo a Crimeia. Finalmente, no domingo, liberou seu uso mais amplo dentro da Rússia. O depósito de munições na região de Bryansk fica a mais de 112 quilômetros da fronteira com a Ucrânia.
O vice-diretor do Centro de Estudos do Exército, Conversão e Desarmamento da Ucrânia, Mykhailo Samus, disse que a introdução dos ATACMS pode ter um impacto imediato. Postos de comando russos, unidades militares, apoio logístico, depósitos de munição, bases, sistemas de lançamento de mísseis e de defesa aérea, radares e outros ativos importantes estão agora ao alcance de uma das armas mais poderosas do arsenal ucraniano, segundo ele. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
(Com Agência Estado)
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