Em meio à polêmica retomada do julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) que pode descriminalizar o porte de drogas no Brasil, cresce em Cuiabá um novo ramo empresarial. Chamadas de “Head Shops”, tabacarias contemporâneas investem em produtos voltados para o consumo de fumo, incluindo o proveniente de cannabis, a popular maconha.
Na capital mato-grossense, apesar de novo, o setor está em expansão. Pioneiro no ramo em Cuiabá, Nelson Yerdliska Júnior, 49 anos, é proprietário da “Lancaster Smokeshop”. Com três lojas espalhadas pela Capital (Centro, Boa Esperança e CPA), o empresário contou ao HNT como iniciou sua trajetória no ramo.
“Eu comecei há sete anos com uma distribuidora de bebidas e conveniência. Embutido ao negócio, colocamos três caixinhas de sedas do Paraguai, elas eram de péssima qualidade, só que sempre saía muito rápido. Com o tempo, fui tendo a percepção de que existia um público 'canabista' em Cuiabá, assim como os tabagistas, que consomem tabaco. Fui conhecendo cada vez mais esse universo e, hoje em dia, oferecemos muitas coisas, fechamos a distribuidora e, agora, só vendemos produtos voltados para o fumo”, relatou.
Atualmente, mesmo o consumo de maconha ainda sendo ilegal no país, os ‘acessórios’ utilizados pelo público tabagista são vendidos legalmente, deixando a critério do cliente escolher que tipo de erva irá “rechear” o cigarro consumido.
“Esse público existe e é uma galera muito fácil de lidar e de classes sociais diversas. A gente pode pensar que não, por estar relacionado à cannabis, mas temos uma variedade de público bem grande, com profissionais liberais, médicos, advogados, mesmo que dentro do armário, a maioria dos nossos clientes são usuários de maconha. Eu vendo produtos para o consumo do tabaco. Agora, se no íntimo da casa do meu cliente ele quiser usar maconha, eu não posso fazer nada. Na nossa loja, não vendemos nada ilícito, é tudo devidamente regulamentado. A partir do momento em que ela compra o produto, não me interessa a forma que ela vai usar", disparou.
Conforme Nelson, diferente do que é propagado pelo senso comum, o comércio “Head Shop” não tem como intuito incentivar o consumo do tabaco – ou maconha –, mas, sim de fornecer produtos de qualidade e que tornem o uso das substâncias menos nociva à saúde.
“Não somos uma ‘loja de maconheiro’, somos uma loja de redução de danos para pessoas que fumam. Nós fornecemos produtos específicos para o consumo, além de itens menos prejudiciais ao corpo de quem usa. Todo mundo sabe que fumar faz mal. Antes, as pessoas fumavam tabaco em folha de caderno, com tinta e tudo. Aquilo é veneno puro, a combustão desse tipo de material faz muito mal”, explicou.
INSPIRAÇÃO NO SUDESTE
Com a mesma pegada da Lancaster, o jovem casal composto por Ana Mendonça, 29 anos, e Alfredo Darcia, 31 anos, decidiu investir no ramo após uma viagem à região metropolitana de São Paulo. Em busca de “coisas novas” para o cenário cuiabano, os proprietários do “Dona Majô” são ainda mais ousados. Além dos acessórios, ela é a única loja em todo Mato Grosso que fornece produtos à base de cannabis.
“A Dona Majô nasceu depois de uma viagem que eu e meu namorado fizemos em São Paulo. Lá, nós encontramos uma tabacaria dentro de uma banca de revista. Tinha todo tipo de acessório: case, bong, tudo que você pode imaginar. Logo de cara, nós ficamos encantados com tudo aquilo e passamos a nos questionar por que não existia nenhuma loja semelhante àquela em Cuiabá”, contou Ana ao HNT.
“Nós sempre enfatizamos que não existe nada dentro da loja que seja fora da lei, tudo o que a gente tem aqui é aprovado pela Anvisa. No início, nós tínhamos muitos cosméticos à base de CDB (canabidiol) e todo mundo ficava meio chocado, mas é algo super comum e dentro da legalidade”, reiterou.
Hidratante labial, lubrificante e chocolate com terpeno (aroma e sabor) de maconha estão entre os itens na vasta lista de produtos 'diferentões' fornecidos pela loja.
“A gente tem muita coisa diferente, nossos clientes vêm aqui em busca de novidades. Nós temos livros, cosméticos, incensos, chocolates com terpeno de maconha, muita coisa que você não encontra em Cuiabá e cada hora encontramos uma coisa nova, é muito legal. Na época que a gente vendia lubrificante e hidratante labial, foi um sucesso, muita gente veio atrás”, disse.
Conforme a empresária, apesar de o tema ainda ser tratado com certa marginalidade, o conceito principal do lifestyle (estilo de vida) canábico com foco na redução de danos é a ‘educação’ dos usuários.
“Aqui na loja, nós vendemos acessórios para consumo de ervas secas. A erva que a pessoa vai escolher para usar não nos diz respeito. Se a pessoa vai fumar camomila, tabaco ou maconha, nós vamos ajudar essa pessoa a fazer com que essa experiência seja menos prejudicial à saúde. A gente sempre indica uma seda com menos cloro, com um tamanho menor para que a queima seja menos nociva, filtros ecológicos, temos piteiras de vidro, bongs, que são instrumentos que reduzem muito os malefícios do fumo. Então, a gente sempre busca educar muito os nossos clientes”, falou.
Sabemos o quanto fumar é prejudicial, não adianta a gente querer pintar um mundo colorido que não é. No fim das contas a gente só busca uma forma de amenizar essa experiência
Na ocasião, a proprietária da loja ainda lamentou a estigma e desinformação em torno do tema. Segundo ela, hoje em dia “não podemos só falar sobre a maconha que é vendida através do tráfico”, visto que já existem inúmeras pessoas fazendo o uso da substância legalmente.
“Quando a gente fala sobre maconha, falamos sobre o desconhecido, até porque não podemos estudar, pesquisar, não sabemos muito sobre. Então, o medo do desconhecido acaba sendo muito grande. Apesar disso, temos que lembrar que já existe uma galera que está conseguindo fazer esse consumo assegurado por lei”, concluiu.
DESCRIMINALIZAÇÃO EM PAUTA
Está marcado para o dia 2 de agosto o julgamento que trata da possível descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal no Brasil.
O processo sobre o assunto deveria ter sido julgado pelo STF em junho deste ano, no entanto, foi adiado em função das sessões destinadas ao julgamento do ex-presidente Fernando Collor.
A descriminalização começou a ser analisada em 2015, mas o julgamento foi suspenso por um pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes.
Até o momento, três ministros – Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Gilmar Mendes – votaram e todos a favor de algum tipo de descriminalização.
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Leandro bicudo 27/06/2024
Parabéns aos empresários, sou cliente da Majo com muita satisfação. Ótima matéria.
Ana Júlia 09/07/2023
Parabéns Ana e Alf, adorei a matéria, vocês são incríveis ❤️????????
2 comentários